sexta-feira, setembro 14, 2007





Feiras Novas e o seu programa informal

João Carlos Gonçalves

Não podia ser de outra forma: ninguém consegue envolver-se com e nas Feiras Novas, como os limianos. Mas não se pense que esse envolvimento não se aprende e não pode também ser assumido pelos forasteiros. Quem vem às festas de Ponte de Lima não pode vencer o bairrismo, a alegria, a espontaneidade, a imersão no espírito festeiro dos nativos nas suas festas maiores. Mas não podendo vencê-lo, pode a ele juntar-se e integrar a imensa e contagiante estúrdia que, por ser tão genuína e espontânea, é inigualável. É assim que se constroem as noites mais longas de Ponte de Lima e do Alto Minho, é assim que as Feiras Novas, as festas do concelho de Ponte de Lima, se tornam únicas e irrepetíveis a cada ano que passa. Porque anunciam o fim do Verão e o regresso a mais um ano de trabalho, constituindo a última oportunidade de participar num ambiente de descontracção e folia como só o Alto Minho pode disponibilizar.
Ponte de Lima não personifica apenas o Alto Minho das tradições. Em dias de Feiras Novas, esta terra representa também a representação moderna de tradições ancestrais, do convívio e da partilha, da festa com todos e para todos.
Esta parte da festa não tem programa. É uma festa informal e espontânea que cresce à medida que a noite vai decorrendo. Nasceu com características próprias e em lugares específicos e apenas com essas características e nesses lugares poderá sobreviver e manter-se como um dos principais atractivos das Feiras Novas.
Recuando trinta anos, recordo as noites das Feiras Novas. Menos participadas e com a animação mais localizada: incontornáveis eram as tascas da “Lia”, no Largo de Além da Ponte, o “João de Coura” e o “Gasparinho Malheiro”, estes bem no centro da vila. Aqui a festa durava até à manhã seguinte ao som das concertinas, tocadas por aqueles que chegavam na sexta-feira ou no sábado de manhã e apenas deixavam a vila na segunda-feira. Incontornável era também a Alameda de S. João onde as tascas “ambulantes” dos Caxadinhas e companhia chegavam e sobravam para colocar todo o espaço em alvoroço, com concertinas em acção até ao nascer do sol.
O resto da vila “fechava” após o fogo e, nas suas ruas, apenas circulavam grupos que se deslocavam entre os locais de animação citados. O Largo de Camões, semi-deserto, era palco mórbido de confrontos, porque para os jovens locais, esse era também um número informal das festas.
Com o decorrer dos anos tudo mudou, para melhor, felizmente. Os bares entretanto surgidos na zona histórica começaram a constituir-se também como espaços de romaria obrigatória, sobretudo por parte das gerações mais jovens que, desta forma, encontraram um espaço à sua medida e dentro dos seus gostos e motivações. Rapidamente a música mais moderna passou do interior dos bares para a rua e, estas passaram a encher-se de jovens que, num cenário único e belo, dançavam abrigados pelas estrelas e iluminados pela lua. As Feiras Novas tinham encontrado e disponibilizado um novo atractivo, este especialmente dedicado ao sector mais jovem da sociedade. O certo é que o programa informal das festas foi ampliado com um número imperdível, que cada ano trás mais e mais gente a Ponte de Lima, que é conhecido e comentado nos quatro cantos do país e que faz com que, no terceiro fim-de-semana de Setembro, o grande “meeting-point” juvenil não seja uma praia ou discoteca da moda, mas sim as a zona histórica de Ponte de Lima durante as Feiras Novas.
O programa informal das festas de Ponte de Lima foi enriquecido. Mantiveram-se as concertinas pela noite dentro, na Alameda de S. João mas também um pouco por todo o espaço festivo, enquanto que a “parte alta” da zona histórica foi ocupada por ritmos mais modernos e jovens.
A festa, hoje em dia, é feita de gente e com gente de todas as idades. As que vivem as Feiras Novas na sua plenitude, acompanhando cada momento do programa formal e deixando-se embalar pelos momentos mais informais; aquelas que procuram os atractivos formais, anunciados no programa e, por fim, os que fazem a sua própria festa, mergulhando na fantástica informalidade de uma noite interminável, divertida e informal. São estas as tradicionais Feiras Novas, velhas na idade, mas que se reinventam a cada ano que passa, pela acção da sua figura mais central e insubstituível: o povo.

Publicado no jornal "Alto Minho" de 2007.Set.14